sexta-feira, fevereiro 11, 2005

Estamos de volta!

Claro, todo mundo já sabe disso, faz quase um mês... Sei que estou em dívida literária com nesse blog. Mas demoramos um tempinho até entrarmos nos eixos de novo. Uns, como o Vidal, foram mais rápidos. Quando ele chegou o cavalo já estava encilhado e andando, então ele montou, pegou nas rédeas e saiu galopando a toda velocidade. Outros, como eu, precisaram de mais tempo... No meu caso montei um jeguinho esquálido e demorei umas duas semanas até me sentir de novo no ritmo. Que coisa isso! Eu não imaginava que uma simples viagenzinha de 26 horas na ida, 23 horas na volta, que durou quase 40 dias fosse causar um estrago desse tipo!

Vimos tanta gente, falamos tanto e temos a impressão de que não vimos nem falamos o suficiente... Tudo bem. Em um ano e meio estamos de volta...

Apesar de cansativa, a viagem foi boa. Claro, tivemos alguns momentos tensos, mas nada grave. O primeiro deles aconteceu com o Vidal e foi dividido em duas partes: no dia em que saímos e no dia em que ele voltou à Universidade...

O Vidal tem um colega que divide a sala com ele, chamado Reza. Ele é iraniano e é uma pessoa super legal. Um bom companheiro para o Vidal que partilha os bons e maus momentos, além de ser alguém com quem ele pode conversar tecnicamente sobre o trabalho. Os dois se apóiam mutuamente nesse período que não tem nada de tranqüilo.

Pois bem. Vocês podem imaginar que a diferença de cultura entre iranianos e brasileiros é bem grande e ela já se fez notar várias vezes nesse um ano e meio de convivência entre os dois. Nada de muito grave de ambas as partes. Mas no dia em que o Vidal foi se despedir do Reza...

Ele chegou na Universidade pra pegar algumas coisas antes de sair e foi dizer tchau. Um simples tchau. Não era uma despedida definitiva. Só um “Então tá! Tô indo... Daqui um mês estou de volta, patati, patatá...” e aí, na hora do aperto de mão... Plaf! O Reza lascou três beijinhos no Vidal! Vocês já imaginaram um marmanjo dando três beijinhos no Vidal? Conseguem fazer uma idéia da reação dele? Nesse caso, foi uma absoluta falta de reação! Ele ficou meio catatônico por alguns segundos, com a mão ainda estendida no ar, a boca entreaberta, emitindo sons meio guturais como “ahn.... eh.....”. E o problema maior nem foi esse! O problema foi que o Vidal ficou os 40 dias ai no Brasil só tentando imaginar como ia ser na volta!!! E esse dia chegou...

Chegamos no domingo à noite e na segunda-feira cedo o Vidal já estava na Universidade. Ele chegou, abriu a porta da sala devagar, foi colocando a cabeça pra dentro e respirou aliviado. O Reza ainda não tinha chegado. Durou pouco o alívio. Uma meia hora mais tarde, o Vidal já estava concentrado no computador, limpando o lixo da caixa postal e, o pior, de costas para a porta. Então ele não teve a chance de se preparar para o golpe! Sim, porque ele veio! O Reza chegou e foi cumprimentar o Vidal. O tradicional aperto de mão. O Vidal com o braço meio duro, o pescoço esticado para trás, mas... Plaf, plaf, plaf! Três beijinhos de novo.

Naquele dia o Vidal chegou em casa completamente injuriado!

- Assim não vai dar! Espero que tenha sido só por causa do tempo longe e da distância! Mas se ele começar a adotar esse hábito todos os dias eu vou ser obrigado e a dizer que no meu país as coisas não são assim, que pra mim isso pega mal, que eu sou um professor universitário, pai de família, alérgico a testosterona, sei lá!

Mas vocês podem respirar aliviados... Foram só esses dois episódios mesmo! Tudo bem que o Vidal já está se preparando psicologicamente para o dia em que formos embora definitivamente! Talvez ele boicote as despedidas finais. Ele ainda está bolando alguma coisa...

Esse foi o primeiro episódio, digamos assim, delicado. O segundo aconteceu comigo.

Na ida, no momento em que estávamos passando pelo detector de metais e pelo raio X da bagagem de mão, já em Paris, eu fui chamada por um inspetor.

- De quem é essa mala?

- É minha.

- A senhora está levando uma faca aqui dentro?

- Faca? Não!

- Foi a senhora quem arrumou essa mala?

- Sim, fui eu.

- Pode abri-la, por favor?

Abri a mala e ela estava cheia de fraldas. Olhei para o inspetor com uma cara de “será que fralda corta”? Mas ele insistiu.

- A senhora não está levando um descascador de legumes aí dentro?

Aí caiu a ficha...

Como nosso orçamento aqui é gordo como um faquir, não podíamos levar presentes para todos como gostaríamos. Mas também não queríamos chegar de mãos tão vazias, então compramos uns chocolates e, para a mulherada da família, eu tive a idéia de levar um descascador de legumes. Eu já tinha vontade de comprar um desses quando estava aí no Brasil, mas como cozinhava uma vez a cada dois meses mais ou menos, acabava nunca comprando. Aqui a realidade é outra e eu já não posso mais viver sem um descascador de legumes. E, o melhor, ele é bem baratinho! Fui a um supermercado e comprei alguns. Eu devia ter imaginado que eles iam me dar problemas... No dia em que eu comprei as faquinhas a moça do caixa já me olhou com uma cara meio esquisita...

Isso quer dizer então, que eu não estava levando um, mas sim NOVE descascadores de legumes na minha bagagem de mão.

Levantei as fraldas e peguei a sacolinha onde estavam os objetos perfuro-cortantes impensáveis dentro de uma cabine de avião nesses tempos de terroristas loucos. Mas o pior nem foi isso...

Quando eu retirei a sacolinha, o inspetor pousou os olhos num tubo de cola spray para tecido. Um produto francês para patchwork super legal que eu estava querendo mostrar para minhas amigas aí no Brasil. Ele pegou a cola e eu falei:

- Ah! Isso é uma cola. Uma coisa ótima, eu faço patchwork, sabe... E essa cola é francesa, só tem aqui. Ela é o máximo e.... Ei! O que o senhor está fazendo?

Ele estava tirando a cola da mala e jogando no mesmo saco de lixo onde tinham ido parar os meus descascadores...

- Isso aqui é uma arma, madame!

E me mostrou um inocente desenho de um foguinho na embalagem.

- Isso aqui dentro de uma cabine de avião é um perigo. E eu não posso deixar a senhora entrar armada e com explosivos na aeronave.

Eu fiquei chocada. O Vidal até tentou me ajudar, dizendo que os descascadores tudo bem, ele até entendia, mas a cola. Será que não daria pra eles enviarem pra nossa casa aqui na França pelo correio? Precisava jogar no lixo sem dó nem piedade?

- E quem vai fazer isso, senhor?

Assim, super simpático. Mas aí ele viu meus olhos e nariz vermelhos, as lágrimas começando a correr pelo rosto e disse:

- Mas por que a senhora não despachou isso na bagagem embarcada? - olhou no relógio - Agora já não dá mais tempo...

Minha vontade foi de gritar:

- Porque eu não tinha nenhuma intenção de seqüestrar esse avião! Ele está indo exatamente para onde eu quero!!! Por acaso eu tenho cara de terrorista? Buááááááá.....

Mas eu vi que ele estava até meio penalizado com o meu estado. Não disse nada... Só fiquei olhando para o saco de lixo, onde estavam meus descascadores de legumes, quer dizer, meus não, de vocês, e a minha colinha... Buáááááá de novo!

O Vidal foi me empurrando.. “Deixa pra lá... Tudo bem, quanto custou tudo isso, 15, 20 Euros? Não tem problema...”

Mas eu fiquei inconsolável por uns 10 minutos. Depois passou.

É CLARO que eu vou levar de novo os descascadores de legumes quando formos embora definitivamente. Dessa vez, vou colocar dentro da mala que vai despachada, é óbvio! Mas que eu fiquei bem decepcionada.... Ah, fiquei.

Isso é passado, agora é tocar pra frente esse um ano e meio que ainda temos por aqui. Tenho várias coisas pra contar, mesmo coisas que já passaram, mas que merecem fazer parte dessas nossas memórias cibernéticas. Aguardem! Vamos ver se eu consigo ser mais assídua por aqui.

Até a próxima!


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