quinta-feira, julho 29, 2004

Enfim, estamos de volta! Cinco mil seiscentos e cinqüenta e um kilômetros e seiscentos metros depois! Daqui a alguns anos, quando eu lembrar que fizemos uma viagem deste tamanho com uma criança de quatro anos e outra de sete meses, vou querer internar a mim mesma e ao Vidal em um sanatório! Mas correu tudo bem. As crianças se comportaram perfeitamente, só um dia o Felipe teve um mal estar que passou rapidinho. Claro que o fato de meus pais estarem junto nos ajudou imensamente com as crianças. Teria sido muito difícil sem eles.

A lista de cidades pelas quais passamos é grande. Vamos a ela: Bordeaux, Cadillac, Carcassone, Avignon, Marseille, Menton, Mônaco, Turim, Milão, Lausanne, Genebra, Berna, Verona, Veneza, San Marino, Assis, Florença, Pisa, Gênova, Voreppe, Limoges! Ufa! Fiquei cansada só de escrever!

Dá pra imaginar que em 18 dias e tantas cidades muitas coisas aconteceram e é verdade. Começou já no primeiro dia...

Chegamos a Bordeaux e fizemos um passeio pela cidade. Acabamos no centro de informações turísticas e descobrimos, por acaso, que estava começando uma feira do vinho exatamente naquele dia! Por 10 Euros teríamos o direito de degustar 15 tipos de vinhos! Bordeaux é uma das maiores regiões vinícolas do mundo. Foi super interessante e ninguém chegou a ponto de chamar urubu de meu louro porque era uma meia taça que dividíamos em quatro.  Aí vai uma foto de um enfeite que tinha no meio da feira:


Enquanto ainda estávamos na feira do vinho, vimos uma fila imensa de carros num engarrafamento descomunal tentando passar por perto da praça onde a bebelança estava acontecendo! (Meu editor de textos está reclamando da palavra, mas, se tem comilança, porque não pode ter bebelança? Bobão!) Ficamos até meio com pena daquela gente dentro dos carros que quase não se mexiam, enquanto a gente estava ali aproveitando os vinhos, rendendo homenagem a Baco, com nosso carrinho confortavelmente instalado num estacionamento longe dali. Bem, cada um tem o engarrafamento que merece, né?

Mas o tempo foi passando, já estava meio tarde e ainda precisávamos encontrar o hotel que tinha sido reservado.

Um parênteses. Foi uma viagem super legal. Mas estamos longe dos tempos de Dólar a um para um em relação ao Real. A realidade agora é o Euro a quase quatro pra um! Isso quer dizer que planejamos tudo e fizemos um passeio com sérias restrições orçamentárias. Saímos daqui já com todos os hotéis reservados (Santa Internet!) e fizemos de forma a manter uma média no valor das diárias. Na França utilizamos uma rede hoteleira chamada Accor. Eles têm hotéis para todos os bolsos (mesmo os furados!). O mais simples deles chama-se Formule 1. A gente nunca tinha ficado num desses porque eles têm os quartos individuais mas os banheiros são comuns. Tudo bem, estamos com a grana meio curta, mas ainda não chegamos ao ponto de precisar dividir banheiros (infelizmente, fomos obrigados a inaugurar nossa experiência num Formule 1 nesta viagem...). O segundo nível de hotel da rede é o Etap. Um quarto simples com uma cama de casal e uma cama de solteiro em forma de beliche (foi o lugar onde tivemos a idéia para resolver nosso problema de só um quarto aqui em casa) e o banheiro fica no quarto. Esses hotéis ficam geralmente fora da cidade, não têm recepção 24 horas e a chave do quarto é um código que a gente digita na porta (o Felipe adora!). Depois dos Etaps vêm os Ibis. Quartos um pouco maiores, não tão padronizados, hotéis mais legais. Um Ibis é o máximo que o nosso cartão de crédito pode suportar. A rede tem outros hotéis, mas eles estão, por enquanto, fora do alcance das nossas notinhas... Em Bordeaux, tínhamos reservado um Ibis. O preço estava milagrosamente parecido com o de um Etap, então aproveitamos! A gente não tinha um mapa da cidade, mas tínhamos imprimido da Internet umas indicações de como chegar ao hotel. Além disso, tínhamos o endereço, o telefone e muita disposição...

Pegamos o carro no estacionamento e voltamos ao ponto onde tínhamos entrado na cidade. O nome do hotel era Ibis Bordeaux le Lac. Logo ali vimos uma placa onde estava escrito: "Bordeaux le Lac". Beleza! Estávamos com sorte. Era só ir naquela direção e depois seguir as dicas que tínhamos imprimido na Internet. Estava escurecendo (o que significa 10 horas da noite), tinha uma lua quase cheia maravilhosa e a avenida margeava o rio Garonne. Tudo perfeito! Quer dizer... Quase perfeito! Sabe aquele pessoal do engarrafamento? Pois é! Descobrimos que estávamos fazendo companhia a eles!!! Depois de demorar mais de 20 minutos para andar uns 300 metros começamos a ficar meio incomodados. Uns 100 metros e 10 minutos à frente o Vidal já estava quase no ponto "roxo com bolinhas brancas" que eu já descrevi para vocês! De manhã, antes de sairmos eu tinha escrito aqui neste blog sobre engarrafamentos enormes, mas eu estava brincando! Todo mundo cansado, o tempo passando e a gente tinha decidido primeiro chegar ao hotel, depois procurar alguma coisa para comer... Isso quer dizer que, além do cansaço, tinha a fome rondando. No meu caso específico, tinha ainda uma imensa vontade de fazer xixi (sempre ele!). Para nosso desespero, descobrimos a causa do engarrafamento: a avenida em que íamos estava interditada por causa de obras e o trânsito estava sendo desviado para o centro da cidade! Centro esse que desconhecíamos! Quando chegamos perto da praça onde estava acontecendo a feira, decidimos tentar fazer uma meia-volta. Tinha uma policial de trânsito orientando a baderna. Pedimos autorização, ela concordou (deve ter pensado "menos um nessa zona!") e voltamos. Teríamos de passar por fora da cidade.

Atravessamos o rio e refletimos: temos de atravessar de novo o rio mais à frente. Tem uma ponte enorme ali. As indicações do Mappy (o site da Internet de onde tínhamos imprimido o roteiro) falam numa ponte. Tudo o que a gente tem a fazer é seguir o rio pela margem oposta àquela em que estávamos e atravessar a ponte. Tudo bem. Vamos lá!

Fomos andando e vendo a ponte se aproximar. Só que em nenhum lugar aparecia uma indicação de como chegar até ela. Fomos chegando, chegando e nada! Passamos por baixo dela!!! Uma coisa enorme aquela ponte... Tinha de ter um jeito de atingi-la! A noite caía cada vez mais escura. Chegamos a pegar umas quebradas, parar numas ruas sem saída. E a ponte ali, do nosso lado. A idéia de descer do carro e escalar a ponte estava descartada. Tinha uma quantidade imensa de bagagem e cada um ali tinha seus motivos pra não entrar numa roubada dessas. Enfim, achamos uma forma de passar a ponte. A partir dali era só seguir o roteiro...

Não sei se foi o cansaço, o estresse ou, quem sabe, o vinho, mas as indicações do Mappy pareciam não ser muito precisas. Acabamos indo meio pelo instinto, não sei qual deles, talvez o instinto da fome, porque chegamos a uma lanchonete fechada, no meio de um monte de outras lojas enormes, também fechadas! Parecia o fim. Já estávamos tentando imaginar a melhor forma de dormir todo mundo dentro do carro mesmo. Quem sabe voltar e ficar embaixo daquela ponte. Era tão grande...

Mas, a tecnologia é maravilhosa, tínhamos um celular e já estávamos no ponto de poder ligar e pedir informações de como chegar ao hotel. É claro que a gente podia ter ligado antes, mas o problema seria dizer: "Olha, estamos aqui num lugar que não sabemos o nome, numa cidade que não conhecemos, embaixo de uma ponte à qual não conseguimos chegar e que nem sabemos se é a que devemos pegar e queremos chegar aí. Como é que a gente faz?" Não dava!

Diante daquela lanchonete fechada, estômagos roncando, conseguimos ligar para o hotel. Felizmente era um Ibis, que tem portaria 24 horas. Pegamos as dicas (realmente estávamos perto) e fomos ao hotel. Assim que chegamos, desceu todo mundo do carro e eu acabei ficando por último. Eu e minha vontade de fazer xixi que àquela altura do campeonato já estava me causando alucinações. Só que eu não conseguia fechar a porta do carro e já estava entrando em desespero! Por sorte o Felipe apareceu e eu implorei que ele voltasse para o hotel e achasse alguém pra fechar aquela porta, ou ficar de guarda no carro porque eu precisava urgentemente de um banheiro!

Alguém chegou por ali e eu entrei no saguão do hotel feito uma flecha! Só tive tempo de ver minha mãe fazendo sinais para uma plaquinha que indicava o banheiro e disparei na direção dela (da plaquinha, não da minha mãe). Acabei saindo nos fundos do hotel! Nada de banheiro! Voltei para o saguão. Sabem o que é pior do que ter de fazer xixi no mato? Não ter nem um mato por perto pra fazer xixi!!!! Juro que eu pensei isso quando, enfim, consegui achar uma "casinha". Só então pude prestar atenção ao lugar...

Foi uma (boa) surpresa! O hotel era super legal. Nem dava pra acreditar que tudo aquilo estava pelo preço de um Etap. Eu e o Vidal tínhamos feito todas as reservas e já fomos avisando que aquela mordomia toda não deveria acontecer novamente...

Fizemos nosso registro e começamos aquela que seria nossa tarefa diária pelos 18 dias seguintes: descarregar o carro (e carregar no dia seguinte, é claro)! A gente tinha tentado ser econômico nas bagagens, mas, mesmo assim, tinha MUITA coisa. Até mesmo uma panela que um amigo do Vidal nos emprestou. Cada vez que a gente chegava com aquela quantidade de coisas eu me lembrava de documentários que vi sobre os retirantes do Nordeste. O problema nem eram as malas, mas a profusão de sacolinhas de todos os tamanhos. Jurei pra mim mesma que numa próxima viagem vou levar só uma muda de roupas e passar todos os dias por uma lavanderia!

Levávamos nas costas nossas bagagens e nossos estômagos que, coitados, só tinham visto os lanchinhos que tínhamos feito durante a viagem além dos vinhos da feira, que eram muito bons, mas não ajudavam em nada a matar a fome! O Vidal perguntou para a recepcionista onde poderíamos jantar. Ela, sorridente, disse que até poderia ser no restaurante do próprio hotel, se ele não tivesse acabado de fechar (eram 11 horas). Mas a gente poderia ir até o cassino que ficava relativamente próximo.

Minha mãe não quis ir. Decidiu fazer um outro lanche com o que tínhamos levado conosco e ficar com as crianças. Vidal, meu pai e eu decidimos ir até o cassino.

O lugar era super imponente. Chegamos mesmo a comentar que a gente não estava com a melhor aparência do mundo: o Vidal de bermuda e havaianas por conta de uma enorme bolha no calcanhar (chuteira nova, sabem como é...), meu pai de trainning e eu, até que estava com uma sainha jeans, mas só depois de voltar para o quarto e me olhar no espelho foi que eu percebi que estava com a mesma cara que eu tinha levantado de manhã, acrescida das várias horas de viagem, degustação de vinhos, caminhos perdidos, xixis encolhidos e tudo o mais. Quer dizer, nossa aparência era mesmo a de retirantes... Mas a fome era maior que a nossa vaidade e nós fomos assim mesmo. O lugar era bonito de verdade. Tirei uma foto:


Eu cheguei até a pensar: "O que é que eles vão fazer? Nos expulsar?"

Nós só não fomos expulsos porque nem conseguimos entrar! Estávamos ainda a alguns metros da porta quando uns cavalheiros de terno (seguranças do lugar) chegaram apontando o trainning do meu pai e dizendo "assim não vai dar", a bermuda do Vidal: "assim não vai dar", as havaianas do Vidal "assim não vai dar de jeito nenhum!". Acho que eles só não apontaram pra minha cara e não disseram "e assim nem pensar" porque meu olhar esgazeado de fome deve tê-los assustado... A nossa perplexidade foi tanta que só começamos a reagir quando já estávamos dentro do carro de novo. O pior nem era a humilhação de ver aqueles rapazes extremamente grosseiros nos mandarem de volta (um deles até tentou ser simpático no final... acho que ficou com pena da gente) mas o fato de que não tinha NADA aberto naquele lugar e naquela hora!

Voltamos para o quarto e nos contentamos com uns sanduíches. Pelo menos o café da manhã estava incluído naquela diária (isso não aconteceria em todos os hotéis). E ele foi o máximo! Lavamos a alma pela noite anterior. Faltava apenas fechar a conta, carregar o carro (oh, vida) e ganhar a estrada. Só que, nessa hora, a (má) surpresa: tinha acontecido um erro no sistema de reservas pela Internet e o preço que tínhamos era POR PESSOA e não por quarto! Isso significa que deveríamos pagar O DOBRO do que estávamos imaginando pagar. Era esmola demais mesmo! Claro que tentamos argumentar... em vão. Tivemos de pagar o dobro.  Ficamos meio apreensivos pelo resto da viagem. Já pensou se todos os hotéis que reservamos fossem o dobro?

Bem, esse foi só o primeiro dos 18 dias de viagem... Já deu pra notar que terei muitas histórias pra contar, né? Mas, chega por hoje, nossos outros episódios pitorescos vão ficar para os próximos posts!

Quanto ao hotel de Bordeaux, já estamos preparando nossa cartinha de reclamação! Temos a esperança de reaver esse dinheiro pago a mais. Vamos ver se a reclamação aqui funciona como reza a lenda... Torçam por nós!


quinta-feira, julho 01, 2004

Oi gente!

Oi e tchau! ESTAMOS SAINDO DE FÉRIAS!!!!

Enfim, depois de dois anos, teremos dias de calma e tranquilidade! Vamos correr atrás das crianças nas ruas, nos desestressar em engarrafamentos gigantescos, quebrar as costas carregando malas, brigar nas filas das entradas dos museus, nos acotovelar para tirar do nosso caminho uma penca de nipônicos de máquinas fotográficas em punho (eles só viajam em grupos de, no mínimo, quarenta pessoas!), encontrar lugares mais estranhos ainda para fazer xixi, ou seja, só paz e harmonia!

Só voltamos dia 18, portanto, nada de blogs nesses dias... Eu sei, eu sei, nossos fãs vão ficar insonsoláveis. Mas voltamos logo e cheios de histórias pra contar!

Até!